josé Mario Pires Azanha


Tema 1. Democratização do ensino e participação política


A participação do Professor Azanha na Secretaria de Educação e no Conselho da Educação do Estado de São Paulo

Arlete Marques da Silva



Ao assumir o cargo de Diretor Geral do Departamento de Educação da Secretaria da Educação (SE) em 1967, em pleno governo militar, o professor José Mário Pires Azanha pretendeu desencadear uma ampla reforma da educação em São Paulo voltada para a democratização do ensino e a valorização do magistério.

Todas as medidas propostas por ele, com o compromisso do professor Ulhôa Cintra, então Secretário da Educação, visavam essencialmente a:
- abrir as portas da escola para todos, antecipando a escolaridade obrigatória de 8 anos;
- valorizar o magistério, chamando os professores a assumir a liberdade e responsabilidade de escolher os seus próprios caminhos na ação educativa.

Além de outros, esses dois objetivos prioritários exigiam e foram acompanhados de significativas mudanças na reestruturação da máquina administrativa da Secretaria da Educação e órgãos vinculados, bem como na revisão de diversos textos legais que até então regulamentavam o Sistema de Educação e o ensino. Embora a sua atuação na Secretaria da Educação tenha sido muito importante pelas medidas significativas que ele tomou na Administração Ulhôa Cintra/Azanha, esta durou pouco mais de três anos. Azanha foi demitido, indiciado e respondeu a processo judicial, acusado de subversivo, por lutar pela superação de entraves institucionais e por não respeitar barreiras que impediam o cumprimento da exigência democrática de abrir a escola a todos, o mesmo acontecendo, logo em seguida, ao Secretário da Educação Ulhôa Cintra. Mas como ele dizia, "a história dirá se os ideais democráticos vingaram ou não". E, menos de dois anos depois, é o próprio Governo Federal que institui, com a Lei 5692/71, a obrigatoriedade da escola de oito anos a todos, exigência que já estava prevista na Constituição Federal, ficando abolido o exame de admissão para continuidade dos estudos após os quatro anos iniciais.

Em 1983, com a abertura democrática e as eleições diretas para governadores, Montoro é eleito e o professor Azanha volta a assumir a direção do Departamento de Educação da SE, retomando o seu trabalho educacional interrompido durante o governo militar. Nesta Administração Paulo de Tarso/Azanha, ele volta a propor a execução de alguns importantes projetos educacionais que exigiam, para a boa consecução, a reestruturação e o "enxugamento" da pesada máquina administrativa da Secretaria da Educação com a consequente limitação de órgãos, grupos e setores administrativos e a descentralização de vultosos recursos financeiros, ações que Azanha iniciou visando a dar maior liberdade e autonomia às escolas e às administrações regionais de ensino. Essas medidas, entre outras, o levaram mais uma vez a se desestabilizar perante uma facção do governo, vindo novamente a ser pressionado e afastado do cargo, mas não sem deixar a marca de sua atuante passagem.

Alertamos o leitor que, se muitos dos documentos e textos aqui indicados apresentam um caráter repetitivo, isto se deve ao fato de que eles foram escritos num espaço de 20 anos de resistências à democratização do ensino, dentro da escola e fora dela e representam o esforço crítico e inabalável do professor Azanha em esclarecer os equívocos de posições corrosivas em relação a um ideal ético-educativo e que partiram, algumas delas, da Administração Estadual e da Universidade.

Hoje, num olhar mais distante, podemos entrever o quanto essas oposições a seu projeto democrático de melhoria do ensino e autonomia da escola foram bem menos prejudiciais quando vieram da escola do que quando partiram do próprio governo, desaguando na interrupção de duas das mais importantes intervenções educacionais já ocorridas em São Paulo.

Azanha sempre mostrou compreensão, mas não complacência, para com a forte resistência do magistério mal preparado para compreender o significado da reforma democratizante e assumir as novas responsabilidades profissionais trazidas pela nova clientela escolar, o que exigia uma mudança de mentalidade. Quanto ao governo, viu-se obrigado a dar a sustentação inicial pela alocação de maiores recursos financeiros destinados à construção de escolas, mas não investiu na valorização salarial dos professores, criando ainda diversos outros "obstáculos institucionais" à própria reforma. A leitura do seu texto "Política e Planos de Educação no Brasil" (Azanha: Tema 8) dará aos interessados uma visão maior da sua aguda percepção da interferência desses obstáculos à melhoria do ensino, gerados no seio de uma realidade que ele conheceu de dentro e muito bem. Sobre esses obstáculos institucionais é também imprescindível a leitura do depoimento que Azanha deu na Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Estado, em setembro de 1983, no "Inquérito sobre Educação em São Paulo", menos de um mês após ter sido novamente afastado da Secretaria da Educação devido a uma manobra política urdida no próprio seio do governo democrático, por setores oposicionistas da própria Administração e da Assembleia Legislativa, cuja história ainda está por ser escrita (diga-se o mesmo com relação à sua primeira atuação em 1967/69, durante o governo militar). Mas o professor Azanha não se distanciaria jamais da escola pública, continuando a influenciar com suas ideias e também gerindo a ação educacional onde podia, seja por meio de sua atuação no Conselho Estadual de Educação, seja na Faculdade de Educação da Usp, seja participando de conferências, fóruns e debates em todos os níveis (Federal, Estadual, e Municipal).

O estudo deste importante período histórico da educação paulista ainda está por ser feito. Um olhar crítico e perscrutador desse passado permitirá que se reescreva a história de um período educacional do qual só temos notícia por meio de jornais e artigos escritos nos embates do cotidiano. Esta pesquisa permitirá também que se descortinem os bastidores da reforma educacional paulista pela investigação dos obstáculos institucionais à reforma, gerados no seio da máquina político-administrativa e que se traduziram em interferências reacionárias a esse projeto.

O estudo desse período histórico permitirá também que se estabeleça uma ponte com o presente, pela busca dos atuais obstáculos institucionais à plena realização desse mesmo projeto educacional: cite-se como exemplo apenas a questão da autonomia da escola face às ingerências da esfera Federal e Estadual (vide Tema 3).

Este e outros temas educacionais que o "Projeto Azanha" propõe são de grande importância para a Educação e abrem um espaço riquíssimo para projetos de pesquisa de candidatos a mestres e doutores. Acreditamos que um estudo sistemático e rigoroso pela leitura inicial dos documentos que o "Projeto Azanha" põe à disposição neste Tema I poderá permitir aos professores e pesquisadores entender não somente a importância da atuação político-educacional do professor José Mário Pires Azanha, mas sobretudo a importância política e o significado da história da educação paulista das décadas de 1960 a 2010.

A compreensão desses acontecimentos históricos permitirá às novas gerações de educadores perceber melhor a escola onde trabalham, com a ajuda da pesquisa sobre a cultura escolar e o cotidiano da escola, inspirada sempre pela intenção de descortinar novas e múltiplas alternativas para a melhoria da ação escolar e educacional em geral. E se essas alternativas, esses múltiplos caminhos existem é porque há escolas e professores que já ocuparam o espaço que lhes cabe e estão desenvolvendo um projeto educacional compatível com o ideal democrático.

Os textos propostos a seguir não esgotam todo o material existente e constituem apenas uma indicação inicial aos interessados no estudo do tema. São documentos que embasaram as propostas educacionais das Administrações Ulhôa Cintra/Azanha e Paulo de Tarso/Azanha, incluindo relatórios administrativos e atos legais que lhes deram sustentação, além de textos e depoimentos sobre o tema, que ele escreveu durante todos esses anos em que atuou como homem público, administrador ou legislador, seja na Secretaria da Educação, seja no Conselho Estadual de Educação e na Faculdade de Educação da USP, mostrando o seu olhar apreciativo e crítico dos acontecimentos dos quais ele não somente participou, mas que desencadeou.



Tema 2. Avaliação do ensino e participação democrática




Jaime Cordeiro


O conjunto de textos que compõem este recorte temático pode ser tomado como uma amostra bastante representativa das principais questões que moveram a atuação política e a produção intelectual de José Mário Pires Azanha em torno do tema da democratização do ensino. Na concepção de avaliação que emana desses textos percebe-se a íntima associação que o autor fazia entre pedagogia e política, na medida em que aquela tem sempre uma dimensão prescritiva que, mais do que convidar, induz aqueles que com ela se envolvem a se engajarem na ação política.

O item I apresenta o que foi aqui denominado Textos Introdutórios ao tema. Trata-se de dois textos produzidos nos anos 1980, no período da redemocratização, mas que se remetem ao período da ditadura militar, comentando as mudanças no ensino no Estado de São Paulo, promovidas na gestão Ulhôa Cintra na Secretaria da Educação, durante a qual José Mário Azanha atuou como Diretor Geral do Departamento de Educação. Trata-se não apenas de uma retrospectiva histórica, mas de uma defesa da perspectiva assumida na reforma empreendida a partir de 1967 e que resultou na integração entre o ensino primário e o ginásio, com a abolição do exame de admissão e a instauração da escola de 8 anos, antiga bandeira dos educadores brasileiros. No momento em que a luta contra a ditadura tendia a rejeitar toda a herança do período, Azanha punha corajosamente em perspectiva histórica as mudanças empreendidas e o resultado democratizador da instauração da escola de 8 anos. A leitura desses textos seminais deve ser complementada pela consulta aos dois primeiros documentos apresentados no item III, Atos legais e relatórios administrativos: o ATO 306 DA SECRETARIA DA EDUCAÇÃO 19/11/1968 e a JUSTIFICATIVA DO ANTEPROJETO "GRUPO ESCOLAR E GINÁSIO" E ANTEPROJETO "GRUPO ESCOLAR GINÁSIO".

No item II, Documentos propostos para estudo, são apresentados textos produzidos em épocas e contextos diferentes e também com preocupações bastante diversificadas. O primeiro e o último documento (respectivamente, AVALIAÇÃO ESCOLAR: ALGUMAS QUESTÕES CONCEITUAIS; e CULTURA ESCOLAR BRASILEIRA: UM PROGRAMA DE PESQUISA) ostentam ambições teóricas mais amplas e surgiram das reflexões do autor a respeito da produção teórica, da atuação pedagógica da produção da pesquisa acadêmica no campo educacional brasileiro e, em particular, no âmbito da Faculdade de Educação da USP, nos seus cursos de Pedagogia e Licenciatura e no seu Programa de Pós-Graduação. Ainda insuficientemente explorado pelos estudiosos da constituição do nosso campo educacional, o segundo texto em particular examina os pressupostos e elabora os fundamentos de um amplo projeto de investigação que deveria estruturar a produção científica na área educacional, retomado logo em seguida por Azanha na sua livre-docência e que resultou no mais do que indispensável livro Uma ideia de pesquisa educacional.

Os demais textos do item II examinam temas diversos, tocando direta ou indiretamente no tema da avaliação e na sua relação com a democracia. Em um parecer emitido no âmbito do Conselho Estadual de Educação, Azanha discute a estrutura administrativa da rede municipal de ensino de São Paulo, resultando numa defesa da instauração dos ciclos frente à tradicional seriação anual, o que já tinha sido pioneiramente anunciado e implantado pelo autor na criação do Grupo Escolar Ginásio no final dos anos 1960. Nos dois textos seguintes, Azanha discute a implantação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), seus pressupostos e suas implicações teóricas e práticas, formulando uma incisiva crítica da “pedagogia das competências” presente na formulação da proposta na gestão Fernando Henrique Cardoso. Por fim, no DOCUMENTO SOBRE O VESTIBULAR, texto que foi discutido em todas as unidades da Universidade de São Paulo, o autor apresenta uma crítica profunda aos critérios de seleção e ao programa exigido dos candidatos ao ingresso na Universidade por meio dos seus exames vestibulares.

Os textos presentes no item III, Atos legais e relatórios administrativos, devem ser sempre consultados como complemento das análises realizadas pelo autor nos seus artigos e outras intervenções de caráter mais amplo. Convida-se o usuário deste Acervo a ler os artigos e documentos aqui selecionados com atenção ao contexto histórico e político em que cada um deles foi produzido. Mas imagina-se que, além de registros documentais de uma época, eles ainda possam servir de inspiração para as mais amplas reflexões a respeito da educação, do ensino, da produção acadêmica e das discussões a respeito do tema da avaliação e das suas relações com a democracia. Concordando ou não com o autor, não é possível ignorar suas observações e os desafios que seus textos propõem ao leitor preocupado com essas questões.


Tema 3. Autonomia da escola e proposta pedagógica



José Mário Pires Azanha: intérprete da escola pública e mestre da educação brasileira

Carlota Boto



José Mário Pires Azanha, para seus leitores, foi um teórico da educação cuja obra já é, entre nós, precocemente clássica. Para os gestores das políticas públicas, foi um administrador e notável conhecedor da realidade da escola pública brasileira. Para seus amigos, uma pessoa inesquecível. Para seus alunos, foi um mestre. Desde jovem, revelou-se intelectual. Abraçou a ética da convicção e a causa da escola pública como sua agenda de vida. Nunca teve medo de polêmicas e esteve no palco de muitas controvérsias, políticas e teóricas. Seu primeiro livro, fruto de sua tese de doutorado em 1972 - Experimentação educacional: uma contribuição para sua análise (São Paulo, EDART, 1974) - trazia hipótese ousada sobre o significado da qualidade de ensino e das escolas experimentais em um país como o Brasil daqueles anos de ditadura.

Suas reflexões sobre os significados das idéias de democratização e de qualidade do ensino bem como seus trabalhos sobre autonomia da escola marcaram o debate educacional no Brasil dos anos 80. Seus estudos sobre o cotidiano escolar e especialmente sua tese de livre-docência, Uma idéia de pesquisa educacional (publicada em livro pela EDUSP em 1992) obtiveram ressonância e desdobramentos teórico-metodológicos em inúmeros trabalhos de gerações posteriores.

Azanha postula o estudo da vida cotidiana da escola como opção analítica e ferramenta de método para se apreender práticas, modos de ser e rituais escolares. Considera ser necessário conferir atenção aos pequenos gestos e prosaicos episódios ocorridos no dia-a-dia das instituições, sem os quais não poderemos compreendê-las. Ressalta, porém, que isso não significa um mero registro de trivialidades, posto que deva ser conferido significado a esse cotidiano. Há pressuposições que dirigem a observação e que deverão dirigir, com argúcia analítica, a interpretação dos fatos. No entanto, a pressuposição não poderá trair a realidade. Se a realidade não combinar com o pressuposto teórico, não se pode mudar a realidade. É muito delicada a fronteira que delimita pressupostos e observação empírica na pesquisa educacional. Para Azanha, a vida cotidiana não se reduz ao local ou ao individual. O estudo do cotidiano precisará voltar-se para a compreensão do uso comum, daquilo que poderá ser generalizado – no limite, do que pode ser compreendido pela acepção de ‘universal’.

Azanha compreende a autonomia da escola como um requisito político. Para ele, a vida nas escolas – queiramos ou não – extrapola as instâncias de regulamentação institucional. Não há nenhuma dimensão legal ou normativa capaz de cercar todos os aspectos que percorrem o dia-a-dia das escolas. Nesse sentido, torna-se fundamental reconhecer o ambiente escolar como lugar de convívio cuja especificidade é o propósito de educar. Uma escola autônoma não corresponde tampouco àquela em que professores e alunos aprendem todos juntos, construindo o conhecimento. Azanha recusa a perspectiva segundo a qual cada indivíduo, ao aprender, reproduzirá em sua mente a marcha histórica do desenvolvimento científico. Tal premissa – que, segundo ele, não se sustenta – contém em si um deslocamento do critério lógico para conferir primazia a uma miragem de pedagogia psicológica.

A escola constitui instância de transmissão de um acervo cultural que envolve o domínio das letras, parâmetros de moralidade e regras de conduta. Azanha não é dos pedagogos que acreditam que a boa escola é invariavelmente aquela que recusa o legado desse acervo cultural em nome da inovação como princípio abstrato. Para ele, a inovação somente poderá ser produzida como fruto do julgamento crítico.
A partir da apreensão de um dado repertório, a crítica criativa permite que o sujeito se oponha aos postulados desse mesmo repertório, criando outra pauta de interpretação. Todavia, não haverá qualquer inovação sem prévio domínio do acervo precedente.

Azanha acredita que a boa escola é aquela que, levando à radicalidade seu potencial de autonomia, elabora sólido projeto pedagógico, envolvendo os protagonistas da vida escolar. Note-se, porém, que para Azanha autonomia não corresponde a qualquer coletivismo político-partidário no território da educação. Por outro lado, a relação pedagógica entre alguém que ensina e alguém que aprende também não é suficiente para caracterizar uma escola de qualidade. O trabalho escolar requererá mais do que isso.

Existe um integrado sistema na escolarização que supõe convivência, diálogo e partilha de atuação entre atores que ocupam lugares variados na vida institucional. A relação dos professores entre si, nas afinidades e nos conflitos que estabelecem uns com os outros; dos alunos com os professores; dos alunos entre si; dos professores com a direção da escola; dos alunos com o diretor e com os funcionários da instituição; o papel dos pais; o Conselho de Escola… enfim, um conjunto enorme de variáveis possibilita uma gama de interações extremamente dinâmica e criativa. Por essa mesma razão, a elaboração da proposta e do projeto pedagógico de cada escola constitui ato estratégico mediante o qual se torna possível estabelecer negociações, acordos e coordenadas de ação capazes de planejar, estruturar, organizar e conferir diretrizes às práticas curriculares em seus diferentes níveis. De todo modo, a despeito da necessidade do traçado do projeto pedagógico, ele, por si só, não será suficiente para interpretar a realidade do cotidiano institucional. O que se passa na escola compõe o registro de sua própria cultura.

Há uma disposição na escola que possibilita a organização de experiência e de rituais que instituem o que Azanha nomeou de ‘cultura escolar’. Cultura escolar será, pois, uma conjugação entre conhecimento teórico e o conhecimento adquirido nas práticas da escola: o saber escolar.

Azanha é pioneiro quando publica na Revista USP Dossiê Educação o artigo "Cultura escolar brasileira: um programa de pesquisas” (dez./jan./fev.1990-91. nº8. p.65-69). Ali ele demonstrava que ‘cultura escolar’ – como categoria de análise – seria uma possível ferramenta operatória para a compreensão dos usos e dos costumes da escola. O estudo da cultura escolar requer a reconstituição de modos de ser e de dinâmicas do agir quando, por exemplo, os professores ensinam uns aos outros; quando o professor sistematiza no caderno seu plano de aula; quando o aluno registra no diário a lição a ser feita para o dia seguinte; quando o professor envia o aluno à diretoria para ‘conversar com o diretor’. Azanha tinha a plena convicção de que existe um campo de saber escolar não-codificado pelos padrões clássicos do conhecimento científico.

A base da ação docente é sedimentada no território da ação pedagógica e possui apenas imperceptíveis afinidades com teorias educacionais. O saber ensinar da memória dos professores inscreve-se nas práticas de suas ações rotineiras. Faz sentido, portanto, averiguar os movimentos da classe: as travessuras das crianças, as repartições das matérias em horários e em espaços específicos, a distribuição dos alunos pelas salas, entre as carteiras, as lições por meios das quais o professor expõe suas aulas, os exercícios realizados para fixar a aprendizagem dos alunos, os silêncios das primeiras provas, o bulício das horas do recreio, a disputa da bola pelos meninos… O rito configura uma forma de cultura própria, produzida nas escolas e autenticamente escolar. Compreender esse movimento será o grande desafio dos estudiosos da pedagogia. Azanha faz um convite para que os teóricos da educação entrem na escola para decifrar o seu texto. Estudar a cultura escolar é - hoje como há vinte anos, quando ele alertava para isso – o grande desafio intelectual dos educadores brasileiros. A contribuição teórica de José Mário Pires Azanha como intérprete da escola aliada a sua prática como professor, como gestor e como integrante do Conselho Estadual da Educação fazem dele expoente e eterno mestre dos educadores brasileiros.

 

 

Tema 4. Ação pedagógica e pluralismo de idéias - a questão metodológica



Entre a teoria e a prática, desvendando os complexos caminhos do discurso educacional à prática pedagógica

Cristiane Maria Cornelia Gottschalk



Os textos arrolados a seguir dispensam informações biográficas ou acadêmicas sobre seu autor, pois cada um deles fala por si, atestando o vigor das idéias de José Mário Pires Azanha e a atualidade das questões levantadas por ele. Nenhum deles propõe resultados práticos e tampouco apresenta uma determinada concepção de ensino e aprendizagem, mas apenas sugere uma linha de investigação fecunda e inovadora dos problemas educacionais, que têm como uma de suas metas a relativização dos pressupostos dos discursos educacionais vigentes, dissolvendo falsas questões que levam reiteradamente a equívocos nas práticas educacionais.

Alguns destes equívocos apontados por Azanha em seus textos estão presentes ainda hoje nos discursos e nas medidas tomadas pelos órgãos oficiais de ensino: o vezo centralizador das normas gerais, ao terem a pretensão de determinar os currículos e as práticas escolares em todo o território nacional; a fixação na figura individual do professor, atribuindo ao seu desempenho as dificuldades de aprendizagem dos alunos; o emprego generalista e dogmático de certas expressões educacionais, tais como “escola brasileira”, “desenvolvimento de competências e habilidades” etc., desconsiderando-se a diversidade da situação educacional dentre outras confusões de natureza teórica e prática que impedem uma maior compreensão da escola em sua concretude, permanecendo-se na superfície dos discursos abstratos. Nos textos a seguir, apoia-se nas reflexões de Miguel de Unamuno, Émile de Chartier (Alain), Bacon, Comênio, Hannah Arendt, Nietzsche, Wittgenstein, entre outros, para combater a pretensão cientificista de tornar o processo educativo mais eficiente, como se isto fosse possível apenas através da aplicação de novas tecnologias de ensino sem que estas sejam acompanhadas de diretrizes e propósitos, os quais transcendem o campo da ciência.

Segundo Azanha, parte destas confusões decorre de uma concepção baconiana de ciência que, transposta para o discurso educacional por intermédio de Comênio no século XVII e por seus seguidores, continua produzindo “enigmáticas ilações sobre o ensino”. Herdeiros desta tradição positivista de ciência, onde o método ocupa uma posição central, os educadores têm defendido a idéia de que ensino eficaz é basicamente a aplicação competente de um saber metodológico, epistemologicamente fundamentado em outros saberes, principalmente de natureza psicológica. Para se contrapor a esta ilusão metodológica, Azanha observa que, mesmo que existissem teorias sobre as várias dimensões do processo educativo, são complexas as questões implicadas no trânsito entre este conhecimento e recomendações metodológicas inequívocas. Em outras palavras, não há fórmulas prontas para orientar a formação do professor.

Um dos pressupostos da Didática que Azanha questiona, por exemplo, é o de que o desenvolvimento tecnológico seria uma conseqüência direta do desenvolvimento científico. Esta crença fez germinar no campo educacional a ideia de que as tecnologias educacionais pudessem ser cientificamente fundamentadas, o que despertou nos educadores “uma exacerbada atitude pró-ciência e um persistente esforço de racionalizar a educação a partir de resultados científicos”, surgindo entre eles uma mentalidade cientificista, mas não científica. Para se contrapor a ela, Azanha recorre a autores como Solla-Price e Ben Davidson, que demonstram a complexa relação existente entre ciência e tecnologia: tanto uma como outra têm desenvolvimentos independentes e apenas eventualmente uma delas propicia novas descobertas no outro campo. Analogamente, Azanha questiona a crença no desenvolvimento de uma tecnologia da educação que teria o poder de assegurar, com eficiência, a produção de alunos competentes em todas as disciplinas oferecidas pelo currículo. Pelo contrário, conclui que a atividade de ensinar não pode ser exaustivamente regulada, ou seja, métodos de ensino podem eventualmente facilitar o ensino de determinados conteúdos, mas não garantem o seu êxito. Seria muito mais proveitoso se os educadores se debruçassem sobre conceitos relacionados à vida escolar, para alcançar a tão almejada formação do discernimento do educador.

 

 

Tema 5. Formação de professores e responsabilidade da universidade




Amaury Cesar Moraes



Introdução

Destacamos, a seguir, três pontos sobre a formação de professores segundo a concepção de José Mário Pires Azanha. De certa forma estão relacionados e embora um deles – questão de método ou metodologia de ensino – apareça de modo mais difuso no conjunto da obra do autor, os outros dois foram expressos claramente na exposição de motivos e justificativa que sustentam a legislação aprovada no CEE-SP a respeito do tema. Tomamos essa legislação - da Deliberação CEE/SP 8/2000 e Indicação CEE/SP 7/2000 – como uma amostra importante da obra do autor em relação ao tema, quer por sintetizar de forma exemplar várias de suas ideias, quer por ser uma das últimas intervenções do autor num órgão normativo da administração pública – o Conselho Estadual de Educação.

Formação de professores: cultura e experimentação (análise)

A partir da leitura da Deliberação CEE/SP 8/2000 (4) e Indicação CEE/SP 7/2000 (5), sublinhamos dois pontos a serem debatidos: 1) Formação de professores segundo uma visão cultural do currículo; 2) Imperativo experimental.

A Indicação se refere à necessidade de entender a escola, a formação do professor, a educação básica como fenômenos “impregnados extensivamente pela herança cultural”. Essa expressão – herança cultural – deve ser tomada em profundidade, pois não parece que esteja presente no texto como um clichê, apenas para dar um colorido e certa legitimidade, característicos retóricos do discurso pedagógico. Mas a legislação proposta não avança em minudências, pois seu espírito é o de estimular a livre elaboração de propostas, é garantir a autonomia pedagógica que se quer a alma da escola básica e tanto mais deve pautar a escola superior – espaço entendido como de formação e exercício de profissionais que atuarão na escola básica. Parece-nos que a formação docente não pode ser pensada exclusivamente em termos técnicos. Aliás, seria muito simples uma proposta técnica para a formação docente, mas nada avançaria em relação ao modo como estão hoje organizadas as licenciaturas. Em boa medida elas estão presas a uma concepção muito técnica, senão tecnológica, em que, como bem aponta a Indicação, de pretensas concepções científicas se extraem dispositivos tecnológicos a que se dá feição de disciplinas.

O caso é que entender um curso de licenciatura como um verdadeiro curso de formação é ir além. Quer inspirado na vertente grega antiga da Paidéia ou na sua versão iluminista da Bildung, formação é algo que incorpora uma perspectiva, isto é, não se reduz a aplicações no campo educacional de informações procedentes do campo das “ciências puras”, tanto menos pode ser a consagração de uma “ciência” - a psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem, travestida de psicologia da educação. E se pensamos naquelas ideias de formação, podemos recolher alguns de seus aspectos: a literatura, o teatro, o cinema, a filosofia, as ciências, a história, a ação política, a solidariedade, as experiências pessoais e as dos outros recebidas por transmissão, a educação dos sentidos e dos sentimentos, a formação para a cidadania e a identidade profissional.

Essa preocupação com a dimensão cultural da formação docente já aparecera em outra reflexão que o Prof. José Mário Azanha fizera a propósito dos Parâmetros Curriculares Nacionais, em Seminário de 1996. (3) Retomamos essa referência porque entendemos que isso favorece uma compreensão mais ampla e mais orgânica das relações entre formação docente e exercício do magistério; para além da coerência do autor, aliás, digna de nota, o que se vislumbra é uma solidariedade entre o currículo para a formação docente e o currículo da escola básica. No texto em questão, o Prof. José Mário dizia que os parâmetros curriculares deveriam levar em consideração aspectos da cultura da comunidade e não exclusivamente o processo de desenvolvimento cognitivo dos alunos, pois rigorosamente o currículo que prepara para a vida, para a cidadania e para uma identidade profissional deve antes refletir a vida, a cidadania e a profissão – e isto pode ser resumido na idéia de cultura. Mas o Prof. José Mário era do tempo em que MEC significava Ministério da Educação e Cultura e o principal livro sobre educação brasileira era o clássico A Cultura Brasileira, de Fernando de Azevedo.

Não fosse a clareza meridiana com que diz que de teorias (supostamente) científicas não se podem extrair propostas educacionais nem prescrições metodológicas eficientes e válidas; não bastasse a crítica incontestável de que a psicologia genética não é a última palavra – a verdade acabada, o esclarecimento de um mistério divino – sobre o processo de aprendizagem humana, mas apenas mais uma versão explicativa e muito parcial de um fenômeno muito amplo e bastante indeterminado como é a educação; não bastasse todo esse bom senso, poder-se-ia acrescentar que a educação brasileira oficial está muito cognitivista e, portanto, desequilibrada, o que, mais cedo ou mais tarde, resultará em monstrengos, em deformação e não em verdadeira e sadia formação de crianças, jovens e adultos. Há todo um lado de condições do desenvolvimento humano que foi abandonado em vista de um mal explicado e mal entendido “ensinar a pensar”, “aprender a aprender” etc., expressões analisadas detidamente pelo autor em outros momentos.

Quem teve a oportunidade de ler a Indicação e a Deliberação pode perceber a insistência com que o Prof. José Mário fala de experimentação como linha característica da criação dos institutos superiores de educação. A ideia aparece como experimentação, experiência, como ensaio, inovação, tentativa e expressões correlatas. É, portanto, mais que uma referência ocasional. Aliás, a experimentação educacional também deve ser um princípio que permeie todos os níveis de ensino, retomando aquela solidariedade de que falamos há pouco, entre formação docente e exercício do magistério: não é só o pesquisador isolado que experimenta, mas todos os que participam da educação: o professor, o administrador, o aluno, a comunidade, o professor do professor, os administradores da educação superior. Ou como pensar em proposta pedagógica – quer para a formação docente, quer para a educação básica – sem pensar em experimentação se não há, em rigor, modelos? Ora, temos de construir esses modelos. Aliás, é o que diz o Prof. José Mário em boa parte do que escreveu, mas que infelizmente pouco efeito tem surtido: nós preferimos fazer reformas e introduzir inovações sem nos preocupar com avaliar a última reforma ou a última inovação, que pomos por terra, porque confundimos o novo com o bom e o antigo com o mau. E talvez isso também tivesse outra causa que, num texto (1) pouco explorado – e por isso mesmo –, acabou sendo profético: as experiências não são tomadas como experimentações – como hipóteses de ação a serem avaliadas na sua viabilidade. Por isso não há o que avaliar em uma experiência, mas apenas que substituí-la por outra, tão logo se sinta necessidade de uma reforma, de novidade. Ou porque o grupo no poder foi substituído. Por isso dizíamos da experimentação responsável e consistente – que deve ter dois vetores: a intervenção na realidade e o reconhecimento das consequências dessa intervenção, positivas e negativas. Por que esse caráter experimental, desde a formação, é assim importante? Porque o professor que formamos deverá estar preparado para ser agente de intervenção, crítico e propositivo, competência concreta de que dependem a elaboração da proposta pedagógica e o efetivo exercício da autonomia da escola.

Método de Ensino: adeus às ilusões! (relato)

Agora tomando como referência o texto do Prof. José Mário Pires Azanha, Uma reflexão sobre a Didática (2), que é antes de qualquer coisa uma crítica, à moda do Prof. Azanha, à ideia de método, passemos a outra questão que interessa ao debate sobre formação de professores. Acho importante esse texto por dois motivos. Para acabar com as expectativas utilitaristas com que meus alunos vêm para as minhas aulas: eles esperam que eu lhes apresente um método ou o método de ensino totalmente exitoso. E o texto do Prof. José Mário funciona como o dístico colocado, segundo Dante, à porta do Inferno: “Lasciate ogni speranza, voi ch’entrate”. Por outro lado, ao fim da leitura e dos debates, meus alunos dizem sentir que o texto os conduz para a ideia de dom – que ser professor com êxito é uma questão de dom - talvez porque o autor fale que o professor é um solitário e que não pode recorrer à ilusão do método. É preciso dizer que no texto não se chega a negar absolutamente a necessidade de método de ensino, sugere-se até a possibilidade de aperfeiçoamento ou melhoria na eficiência das aulas tendo em vista algumas regras de procedimentos – um caminho? - mas que não se espere nenhuma panaceia disso. Voltemos, então, à encruzilhada de meus alunos: eles percebem que realmente não há métodos infalíveis – exaustivos e exitosos - mas também ficam insatisfeitos com a conclusão a que chegam – que é bom que se diga, foi negada pelo próprio autor quando, em conversas, disse-lhe o que os alunos pensavam a respeito: que ser um professor exitoso é uma questão de dom ou vocação.

O Prof. José Mário não acreditava nos poderes milagrosos das metodologias de ensino e era uma descrença que levava para as atividades não docentes ou filosóficas. Quando esteve na administração pública no fim dos anos 1960 e efetivou a reforma que pôs fim aos exames de admissão, instituindo a escola de oito anos, não levou em consideração que a ampliação do acesso a vagas, que se convencionou chamar “democratização do ensino”, não só mudou quantitativamente as coisas, mas também qualitativamente – o que alguns vêm redefinindo com o bordão “quantidade é qualidade”, em vista das críticas à “queda” da qualidade do ensino nas escolas públicas paulistas desde então. Pois bem, ao ser-lhe perguntado se tal mudança – mudança de público, “passagem de uma escola de elite para uma escola democrática”, como os defensores da reforma afirmam - não deveria ser acompanhada também por uma mudança na formação dos professores, especialmente quanto à sua formação técnica, digamos, em termos de mudanças na metodologia de ensino, ele negava por dois motivos: 1) pela falta de recursos – lembrar que não houve aporte substancial para a expansão da rede, mas apenas uma adequação, tal como já havia ocorrido com as Reformas Caetano de Campos e Sampaio Dória; 2) não havia porque investir em novos métodos de ensino porque isso era ilusório ou equivocado. Diante disso, caberia apenas observar os fatos e recolher deles as lições.

 

Tema 6. Assistência e cooperação para o desenvolvimento do ensino


Maria Victoria de Mesquita Benevides


Alguns anos atrás, ao discursar em homenagem ao Dr. Carlos Pasquale na Academia Paulista de Educação, o Prof. José Mário fez questão de esclarecer que, tendo sido escolhido para saudá-lo, sentia-se "o verdadeiro homenageado, pela honra de falar de tão notável figura de homem e educador".

Faço minhas as suas palavras de então, querido professor. Sinto-me homenageada por ter o privilégio de saudá-lo neste dia.

Emérito, no sentido de sábio e insigne, José Mário Pires Azanha já o era, em 1985, quando ingressei nesta casa. Durante algum tempo fiquei arredia, contra minha natureza expansiva, pois vinha temerosa da fama do mestre rigoroso e de sua impenitente ironia, além da sabida implicância com a Sociologia, a "prima pobre e meio coitadinha" da Filosofia, do Direito e da História. Felizmente perdi pouco tempo com esse afastamento pueril — logo descobri o prazer da convivência com uma inteligência iluminada e um coração generoso, um senso de humor burilado na fina leitura de Eça de Queiroz, uma erudição discreta e disponível, dos pensadores clássicos aos contemporâneos, de Platão a Wittgenstein, de Comênio a Dewey, de Padre Vieira a Sergio Buarque de Holanda. Descobri, encantada, que sua impaciência com a Sociologia — muitas vezes argutas provocações a nós, sociólogos — revela também um profundo conhecimento de nossos maiores autores, Durkheim, Comte, Marx, Weber.

Somos gratos a José Mário pela divulgação do pensamento do professor, ensaista e publicista francês Alain entre nós — registro seu belo prefácio na tradução brasileira da obra Propos — assim como lhe devemos uma discussão inovadora sobre Hannah Arent e a democracia vinculada aos temas educacionais. Lembro, também, suas instigantes leituras em Antropologia, que transparecem em escritos de argumentação filosófica e de metodologia científica, como na interpretação do famoso texto de Geertz sobre a briga de galos em Bali.

Creio que uma das melhores contribuições intelectuais do Professor à Faculdade de Educação tem sido a exigência da leitura das grandes obras literárias, do Brasil e do exterior, dos clássicos aos contemporâneos. De seus alunos não costuma perguntar só o que estão estudando, mas o que estão lendo. Quer saber o que estão lendo apenas pela busca do conhecimento, mas também por puro deleite, emoção, alimento do espírito, "humanização". Humanização no sentido da tese de nosso mestre comum, Antonio Cândido, que, ao discutir os problemas do ensino insiste em reivindicar que os estudos literários – e o prazer da leitura – voltem à Escola Pública, no espaço privilegiado que sempre tiveram.

Retorno a Alain, com quem José Mário tem vários pontos de identidade intelectual. O professor Alain, enragé republicano da éducation nationale, considerava mais importante saber se o aluno era capaz de ler a Revolução Francesa nas palpitantes páginas de Michelet – com agrado, como um espectador de teatro, como um bom músico lê música – do que decorar os eventos nos compêndios acadêmicos. Tenho certeza que José Mário pensa assim.

Em poucos anos de conversas descompromissadas com o Professor, muito aprendi sobre História e Filosofia da Educação, sobre políticas educacionais e outros temas candentes nas Ciências Humanas. E quando falo em coração generoso e erudição notável, refiro-me também a essa sua constante disponibilidade para nos ajudar a pensar, a indicar uma bibliografia, a desmontar e remontar um argumento. É, nesse sentido, um verdadeiro professor à moda antiga, aquele que "ensina a aprender", que estimula a inteligência, que provoca a dúvida. Como diria Alain, "tudo o que se inventa sobre a Educação será miserável por falta de se ter refletido sobre a dificuldade de pensar".

No campo específico da Educação, José Mário tem sido, é claro, um grande professor, mas também um autêntico homem público. É bem conhe¬cida sua participação em órgãos do Ensino Público, desde seu ingresso no magistério aos 18 anos. Ainda cito Antonio Cândido, quando disse, certa vez, referindo-se a Fernando de Azevedo, que há grandes intelectuais e grandes homens públicos e que seu mestre era ambos. Podemos dizer o mesmo de José Mário. Basta lembrar, por exemplo, sua corajosa e lúcida atuação durante a administração Ulhoa Cintra na Secretaria de Educação em São Paulo. Minha admiração pelas reformas democráticas então defendidas pelo Professor Azanha reflete, no plano individual, o justíssimo reconhecimento de todos aqueles que trabalham pela democratização do ensino em nosso país.

Tenho, também, a maior admiração pelo intelectual que não se refugia na tal "torre de marfim". Um espírito de refinada erudição como José Mário, e que "se encarna" concretamente na Administração e nas políticas públicas – ali, no trabalho árduo e cotidiano e muitas vezes desgastante, maçante, mal compreendido – revela em mais alto grau a virtude cívica, o comprometimento real com o bem comum e, neste exemplo, com a causa maior da Educação para todos. É o que dizia Max Weber sobre a "política como vocação": – é preciso ter aquela qualidade do marceneiro que trabalha com madeira para realizar obras belas e úteis, mas é preciso paciência e paixão.

Na Faculdade de Educação gostaria de destacar, além de sua presença constante na Escola de Aplicação, a gestão do Professor na presidência da Comissão de Pós-Graduação e na Chefia do Departamento de Filosofia da Educação e Ciências da Educação, em época de transformações, reformas normativas, regimentais e curriculares, criação de novos cursos, ampliação da Pós-Graduação etc. No plano pessoal, devo ao Professor o apoio para a introdução da disciplina Educação e Cultura Brasileira, que teve a entusiasmada recepção dos alunos na graduação e na pós-graduação. Sua proposta de criação da área de pesquisa em "Cultura Escolar" abriu caminho para vários docentes dos três Departamentos, que desenvolveram pesquisas e estabeleceram intercâmbio com o exterior, sobretudo França e Portugal.

De sua presença na Congregação, escolho um exemplo: é dele a pro¬posta de vincular o voto da Congregação aos resultados das consultas à comunidade para eleição dos diretores, medida de evidente comprometimento democrático.

No âmbito mais amplo da Universidade de São Paulo, merece igualmente destaque a atuação do Professor como o primeiro Coordenador da Cátedra UNESCO de Educação para a Paz, Democracia, Direitos Humanos e Tolerância. Em sua gestão, José Mário apoiou iniciativas relevantes que até hoje prosperam, na docência, na pesquisa e, sobretudo, no trabalho permanente de formação em Direitos Humanos nas escolas públicas. Tenho o grande prazer de continuar atuando neste projeto, junto com o Professor José Sérgio Fonseca de Carvalho, também do nosso departamento e aqui presente nesta homenagem. Foi durante a gestão do Professor Azanha na Cátedra UNESCO que nosso companheiro de mesa, Professor Fábio Konder Comparato, iniciou sua obra "A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos" - hoje em sua 3a edição – referência obrigatória sobre o tema e marco importante dos trabalhos da Cátedra.

Muito mais poderia ser dito e não se esgotariam as referências que amplamente justificam o título de Emérito ao Professor José Mário Pires Azanha.

Gostaria de dizer, finalmente, que sempre entendi a afinidade política entre José Mário e Leonel Brizola, um nome que já se tornou uma "instituição" na história brasileira em defesa do nacionalismo e da Educação Pública. Acima de tudo, José Mário é um homem que escolheu um lado na vida, e nele permanece com dignidade e coerência. O lado daqueles que não aceitam a mera retórica democrática, mas querem a construção da democracia para todos, e não como privilégio para alguns.

É nesse lado que José Mário tem defendido, como o fizeram grandes educadores do porte de Fernando de Azevedo e Anísio Teixeira, a democratização da Educação como uma causa nacional. Isso é ser nacionalista sem patriotada ou pieguice. Isso é amar o Brasil e sentir-se autenticamente integrado no povo brasileiro – como um intelectual comprometido com a justiça social, com aqueles ideais imorredouros da liberdade, da igualdade, da solidariedade.
 

Tema 7. A pesquisa educacional e o cotidiano da escola



Cultura escolar brasileira: um programa de pesquisa

José Mário Pires Azanha



A crise atual da educação brasileira é demasiadamente visível para que possa ser negada até mesmo pelo leigo, pelo homem comum. Essa excessiva visibilidade, como não poderia deixar de acontecer, é, contudo, um poderoso fator de obscurecimento quando se quer compreender em profundidade as raízes da crise e as perspectivas de sua superação. Até mesmo o especialista, envolvido na angústia que acompanha as épocas de crise, parte da obviedade da crise para a estereotipia das análises e para o açodamento das soluções.

No caso brasileiro, todos sabemos que a crise educacional atual é apenas parte de uma crise muito ampla, que é inegavelmente política, na qual anos de sombra permitiram que os interesses coletivos fossem tratados sem a indispensável publicidade. Daí vivermos hoje uma situação política em que as exigências de discussão, consenso e transparência transformaram-se, de modo exacerbado, no critério único para viabilizar qualquer solução. Sem discutir a completa razoabilidade desse quadro, pode-se com inteira propriedade examinar possíveis efeitos da extrapolação para a crise educacional de uma exigência inteiramente justificável na vida política.

A legitimidade política da reivindicação por uma maior participação na discussão e no encaminhamento dos interesses coletivos conduziu os educadores, muitas vezes sem maior análise, a exigirem também que as questões educacionais – embora muitas fossem estritamente técnicas – passassem a ser discutidas e resolvidas por assembléias e conselhos não apenas de educadores e pais, mas até mesmo de alunos. Não se põe em dúvida que incentivar as comunidades a se interessarem pelas escolas que as servem e a pressioná-las a serem boas escolas é inteiramente defensável. Daí a admitir que a situação pedagógica não requer nenhuma qualificação profissional para a sua condução é até mes-mo urna desvalorização da formação do professor. Quais são as perspectivas de que esse encaminhamento seja razoável e contribua efetivamente para a solução da crise educacional em que vivemos? Não é fácil responder a essa questão.

Um mínimo de reflexão nos lembrará que, historicamente, o aparecimento de escolas representou a institucionalização de práticas que, pela sua crescente complexidade, exigiam a liberação parcial das famílias do esforço educativo. Esta transferência de responsabilidades foi um processo muito complexo e envolveu, em cada sociedade e em cada momento histórico, as cambiantes e problemáticas relações entre o público e o privado. Nesse quadro, não é óbvio que a interpenetração máxima entre escola e comunidade seja indiscutivelmente um benefício para a educação das crianças. Aliás, como observou H. Arendt, a propósito da crise educacional americana, esse procedimento significa até mesmo o retorno a uma concepção ultrapassada da infância e da juventude que ignorava a especificidade dessas fases da vida humana
.

Segundo a autora, no afã de "modernizar" a educação, os educadores poderão estar simplesmente trazendo para o seu âmbito "juízos e preconceitos acerca da natureza da vida privada e do mundo público e sua relação mútua, característicos da sociedade moderna", mas que poderão revelar-se retrógrados e até mesmo perniciosos no ambiente escolar porque "a escola não é de modo algum o mundo e não deve fingir sê-lo; ela é, em vez disso, a instituição que interpomos entre o domínio privado do lar e o mundo, com o fito de fazer que seja possível a transição, de alguma forma, da família para o mundo"
. Também, para Alain, não se deve fundir o mundo da escola e o mundo do lar.

São instituições diferentes e indispensáveis, na sua diferenciação, para o desenvolvimento da criança. Na primeira, prevalecem os afetos doados e os laços de sangue, na segunda, as relações já têm um mais forte compo-nente de regulação social. Integrar esses mundos diferentes pode, eventualmente, representar a sonegação de importantes oportunidades educativas às crianças e aos jovens, que poderiam encontrar na escola um espaço socialmente diferente daquele propiciado no confinamento familiar.

(1)
"Como pôde acontecer que se expusesse a criança àquilo que, mais que qualquer outra coisa, caracterizava o mundo adulto, o seu aspecto público, logo após se ter chegado à conclusão de que o erro em toda a educação passada fora ver a criança como não sendo mais do que um adulto em tamanho reduzido?".
ARENDT, H. A crise na educação. In: ______. Entre o passado e o futuro. Tradução de M. W. Barbosa de Almeida. São Paulo, Editora Perspectiva, 1972, p. 237.
(2)
Ibid., p. 23.

 

Tema 8. Política e planos de educação para o sistema de ensino - municipalização e autonomia


José Mário Pires Azanha


A tese e a luta pela municipalização do ensino de 1º Grau são muito antigas no Brasil, mas podemos tomar como um marco nessa trajetória o pensamento de Anísio Teixeira. Já em 1957, ele apresentou suas idéias num Congresso Nacional de Municipalidades, cujo exame faremos em seguida, muito brevemente
.

As idéias de A. Teixeira sobre o assunto eram muito claras e poderão ser resumidas nos seguintes itens:

a) a municipalização abrangeria apenas o antigo ensino primário (na época, o ensino pré-primário era algo muito distante e irrealizável). Com relação ao ensino primário, o município teria as atribuições de organização, administração e execução. Apenas a supervisão ficaria a cargo do Estado;

b) o desempenho das atribuições municipais de educação ficaria a cargo de um Conselho de Educação. Na ordenação do ensino municipal, o Conselho local atenderia às normas de uma lei orgânica do ensino elaborada por um Conselho Estadual de Educação em consonância com as diretrizes e bases da educação nacional, interpretadas por um Conselho Federal de Educação;

c) ao Conselho Municipal de Educação caberia a determinação do custo do aluno nas escolas do município e a fixação da cota municipal de contribuição possível para fazer face a esse custo. A complementação desses recursos seria feita pela transferência ao município de uma cota estadual e de uma cota federal. Para administração desses recursos haveria, em cada esfera, os respectivos fundos de educação;

d) para A. Teixeira, a municipalização do ensino primário ofereceria vantagens de ordem administrativa, social e pedagógica. Quanto à primeira, as razões são óbvias. Quanto à segunda, as vantagens adviriam do fato do professor ser um elemento local ou pelo menos aí integrado e não mais um cônsul representante de um poder externo. Quanto à terceira, residiria principalmente na possibilidade do currículo escolar refletir a cultura local.

Não obstante a brevidade do resumo, pode-se perceber que A. Teixeira tinha sobre o tema da municipalização do ensino um conjunto coerente de idéias. Não pretendemos fazer uma análise do modelo proposto, mas apenas ressaltar que, para o autor, a municipalização do ensino era a resposta a uma situação a ser modificada, a fim de que o ensino primário reunisse condições de melhoria de padrão que, de outro modo, não parecia viável. Inspirado na educação norte-americana, de tradições fortemente locais, pareceu a A. Teixeira que uma reordenação das responsabilidades municipal, estadual e federal seria suficiente para que a instituição escolar de nível primário se fortalecesse e se consolidasse. Sabemos, hoje, que essa visão era um pouco simplista e algo romântica, porque ignorava, deliberadamente, toda a complexidade do jogo político que cerca o traçado de uma política educacional de dimensões tão amplas.

Mas, em que pese a singeleza do modelo proposto, nele a municipalização tinha um propósito claro: a melhoria do ensino primário. Desde então, até os nossos dias, essa clareza foi sendo perdida e nem sempre é fácil saber o que se pretende quando se fala em municipalização do ensino, como examinaremos, sinteticamente, em alguns pontos:

1. Em primeiro lugar, é preciso lembrar que, após A. Teixeira, o tema da municipalização saiu de moda por muitos anos e não são poucos aqueles que interpretam o seu retorno aos debates educacionais como expressão da vontade política de fragmentação dos movimentos sindicais do magistério. Embora essa interpretação possa ter seu grão de verdade, é inegável que o tema da municipalização do ensino é também um componente de um pathos participativo. Após duas décadas de uma ordenação legal autoritária da vida nacional, há uma ânsia participativa em torno da qual têm se congregado todas as camadas da população. Hoje, há até um mito da participação como se apenas as iniciativas que dela decorressem fossem válidas e aceitáveis, até mesmo quando a complexidade do assunto pudesse não recomendar simples decisões consensuais, frutos de esforços participativos. Como integrante desse pathos, o termo municipalização se relaciona fortemente com outros como descentralização, desconcentração, consenso, etc., todos eles positivamente valorizados, como se invariavelmente indicassem maior democratização e, também, maior racionalização. Todos sabemos que as coisas não são bem assim e que a simples administração local do ensino não representa por si só nenhuma garantia de sua efetiva democratização e pode até mesmo ser oportunidade de exercício de formas mais duras de coerção sobre o processo educativo e sobre o magistério.

2. Nesse quadro, em que a municipalização do ensino se transformou muito mais numa bandeira do participacionismo do que num projeto educacional, é preciso um esforço no sentido de impedir que a exploração política do tema nos conduza a um desmantelamento não-seletivo e, por isso mesmo, não-racional do sistema estadual do ensino de 1º Grau. Municipalização do ensino é apenas uma expressão abstrata e, nessas condições, nada indica que deva provocar reações de apoio ou de desaprovação. É preciso - como fez Anísio Teixeira - que indiquemos claramente quais são os problemas que se pretende resolver com uma política municipalista em educação. Sem isso, a retórica pró-municipalização, como também a retórica antimunicipalização são inteiramente vazias, não obstante o tecnicismo de que se revistam e, eventualmente, podem até ensejar fortes prejuízos à causa educacional. Contudo, foi nesse quadro que as constituições federal e estadual instituíram a municipalização do ensino. Mais ainda, ambas as constituições falam em sistemas municipais de ensino de maneira genérica e ambígua o que, eventualmente, poderá contribuir para aumentar a confusão com relação ao tema.

3. Já em 1968, a Lei nº 10.125, que instituiu o Código de Educação do Estado de São Paulo, distinguia claramente sistema de ensino e rede de escolas, conceituando aquele como o " conjunto de normas que disciplinam, em seus vários aspectos o processo educativo". Essa distinção entre a noção restrita de sistema de ensino e a de rede escolar é útil para um clareamento do assunto, porque permite o estabelecimento de coordenadas claras para projetos de municipalização do ensino. É evidente que municipalizar o ensino, instituindo um sistema próprio num sentido amplo, é coisa muito diferente de municipalizar o ensino apenas assumindo a administração de uma rede de escolas. Não obstante a linguagem das constituições possa, talvez, permitir ambas as interpretações, é de se crer que, após a promulgação de uma nova lei de diretrizes e bases da educação nacional e da lei que organizará o Sistema de Ensino do Estado de São Paulo, como está estabelecido nas constituições, escassa será a margem de liberdade para que os municípios organizem os seus sistemas de ensino num sentido amplo. Os projetos de municipalização terão de se ater às ordenações dessas leis maiores. Mas talvez não haja nesse cerceamento legal um mal maior, se houver uma mobilização do poder de pressão dos municípios, no sentido de impedir que as futuras leis, antes referidas, estabeleçam de forma sufocante a parte obrigatória do currículo. É preciso assegurar que a um núcleo comum, obrigatório e, por isso, nacional, nada mais seja imposto pelos conselhos federal e estaduais de educação. Somente assim, em cada município, as escolas poderão oferecer, ao invés de um currículo amplo e de mentira, aquele outro que refletirá as tradições locais e as possibilidades efetivas de cada município. Nem se diga que isto comprometerá uma unidade nacional desejável e que municípios pobres teriam um currículo empobrecido. Não há unidade curricular nacional construída sobre a mentira e o faz-de-conta. Se um município não tiver condições de enriquecer um currículo nuclear e obrigatório, a simples ampliação do estudo da língua nacional teria um alto efeito educativo.

4. Mas, realmente fundamental, para que a municipalização do ensino não seja um projeto utópico e nem uma retórica a serviço de interesses que nada têm a ver com ensino, é necessário que principiemos a discussão do assunto com a idéia de que a municipalização só é defensável se puder contribuir para a melhoria do ensino, como queria A. Teixeira. Nesse sentido, o passo inicial é municipalizar a preocupação com o problema educacional. Sem isso, tudo o mais é tempo perdido. Não há e nem haverá providência legal que substitua o sentimento coletivo de que é urgente melhorar o nível educativo de nossas escolas. Este é o ponto central do problema.

Nessas condições, a discussão da municipalização do ensino a partir de considerações tributárias, políticas e administrativas ou a partir de considerações abstratas sobre centralização, descentralização, etc. significa um rodeio daquilo que é essencial e poderia ser esclarecido pelo esforço em responder à seguinte questão: Como pode a municipalização contribuir para uma efetiva melhoria da escola pública de 1° Grau?

Antes de fazer uma tentativa no sentido de responder a essa questão central, convém fazer algumas considerações sobre a própria escola pública paulista.

5. Todos sabemos que é grave a crise do ensino público brasileiro. Mas, é bom lembrar que, em termos de Brasil, essa crise, que é antiga, se dilui e se amolda a um panorama nacional de pobreza e de arcaísmo das instituições sociais vigentes, historicamente consolidadas por tradições de autoritarismo e de opressão. Por isso, já em 1953, Abgar Renault, falando sobre a crise do ensino brasileiro, perguntava:

"...como exigir e esperar que o nosso ensino seja bom,
isto é, superior às demais coisas que possuímos? Que
instituição nacional funciona melhor do que ele?"
.


Em São Paulo, porém, o quadro geral é outro e por isso a atual crise da escola pública assume proporções que parecem catastróficas, porque a riqueza do Estado, os padrões de vida e novas formas de relacionamento social já alcançados em outros setores contrastam fortemente com os sinais de falência da instituição escolar que, segundo se diz, em outras épocas foi excelente e até modelar. Esse é o quadro da escola pública que todos conhecem, que a imprensa comenta e que vem compondo uma imagem do ensino público como um ensino falido. Será, porém, que essa imagem é inteiramente real? Será que o destino da escola pública paulista já está irremediavelmente traçado, tal como o descreve o crescente processo de estigmatização da instituição?

Não o cremos. Não acreditamos que a escola pública já seja uma instituição falida, embora não se possa deixar de reconhecer que, a persistir o quadro atual, a falência talvez seja inevitável porque, na última década do século, a escola paulista de 1º Grau ainda não abrange toda a população escolarizável e mesmo aquela parcela que é alcançada acaba, em proporções significativas, sendo expulsa pela evasão e pela repetência. E mesmo aqueles que sobrevivem a essa dizimação pedagógica terminam o seu curso pouco além do limiar do analfabetismo ou, pelo menos, em estado indiscutível de penúria cultural.

Quando, há décadas, A. Teixeira escreveu um livro de combate: Educação não é privilégio, ele pretendia denunciar a alarmante situação da escola primária brasileira cuja composição de matrícula da 1ª à 4ª série assemelhava-se a uma pirâmide. Muitos entravam na 1ª série, mas poucos concluíam o curso. O restante perdia-se pela evasão e pela repetência, como hoje. Era assim no Brasil e era assim em São Paulo.

A grande diferença entre a situação atual e essa situação passada é que, então, a escola era aceita como privilégio e desempenhava uma conveniente função de discriminação social: expulsava os pobres e conservava os privilegiados. Por isso, a escola de antigamente, que também nem era tão boa quanto se imagina e se alardeia, era aceita porque servia aos privilegiados que, em casa, tinham um ambiente cultural que supria as deficiências do ensino escolar. Mas, hoje, essa paisagem foi profundamente alterada pelas grandes transformações socioeconômicas ocorridas em São Paulo nas últimas décadas. Grandes contingentes populacionais chegaram ao Estado. A escola pública estendeu-se para abranger uma população que nunca antes procurara a escola mas que, agora, necessitava dela para assimilar os elementos culturais mínimos para poder integrar-se ao mercado de trabalho.

Nesse quadro é que a crise atual da educação paulista assume proporções alarmantes porque, para a imensa maioria da população que procura a escola pública, ela é um complemento único e por isso indispensável ao próprio processo de socialização da criança, cujos pais, erradicados de sua própria cultura e socialmente desagregados num ambiente estranho, são obrigados a jornadas de trabalho que inviabilizam uma convivência familiar satisfatória. Com essa convivência familiar prejudicada e sem a convivência social que a escola poderia e deveria proporcionar, a criança assimila, pelas ruas, padrões anti-sociais de comportamentos. Nessas condições, a escola pública não pode falhar porque, se é verdade que é muito difícil a determinação do valor relativo da educação como elemento de ascensão social, um ponto é indiscutível: a ausência da educação num meio social altamente urbanizado é devastadora e marginalizante.

6. A atual situação do ensino de 1º Grau em São Paulo é a resultante de anos seguidos da conjugação de erros governamentais, de interesses corporativistas mesquinhos e de uma incompreensível ausência de responsabilidade cívica de grande parte da sociedade. Em face dos propósitos visados, vamos deter a nossa atenção apenas na irresponsabilidade cívica com relação aos destinos da escola pública. Porque é com relação a esse ponto que pretendemos tentar responder à questão sobre a possível contribuição que a municipalização do ensino pode dar para reverter a atuai situação da escola pública.

Essa contribuição será uma decorrência do modo de conceber a municipalização. Como dissemos anteriormente, o fundamental é municipalizar a preocupação com o problema educacional e isso não será feito por nenhuma providência legal. A municipalização precisa consistir num movimento de convocação e mobilização de todos os setores da sociedade local no sentido de salvação da escola pública. E isso, evidentemente, só tangencialmente está ligado à administração do ensino e à construção ou reforma de prédios escolares. Dentre os fatores desencadeantes da crise da escola pública, há componentes psicossociais muito fortes e que poderiam ser designados pela expressão falta de compromisso com a escola pública. Falta de compromisso profissional e político do magistério e falta de compromisso cívico de toda a comunidade. E uma questão de mentalidade. Não há mais tempo a perder. Em matéria de educação pública, atingimos um ponto-limite. Além dele, é possível a tragédia e a convulsão social. Ou salvamos a escola pública ou fixaremos um destino de miséria física e social para milhões de crianças.

Por isso, não há mais desculpas para ninguém que detenha alguma parcela de responsabilidade civil. A questão da qualidade do ensino há muito deixou de ser simples assunto técnico para emergir como questão relevante e premente de interesse público e, nessas condições, precisa ser enfrentada pela própria sociedade como um todo. Nenhuma violencia possível sobrepassa em efeitos sociais duradouros a reprovação maciça e a evasão de milhões de alunos, mas as comunidades têm permanecido insensíveis diante dessa situação. No entanto, é com freqüência que se assiste à mobilização da sociedade em face de ameaças à natureza. Mas, a verdade é que a espécie humana também faz parte dessa natureza que tanto nos preocupa. A preocupação ecológica precisa alcançar, também, as crianças, indiscutivelmente, muito mais valiosas do que baleias e jacarés. Por isso, a municipalização do ensino precisa, antes de qualquer outra providência, constituir-se numa mobilização social intensa e sistemática na defesa da escola pública.

7. É claro, porém, que esse movimento não pode ser uma ação social exterior à escola, como quem levanta um corpo inerte. A municipalização do ensino será uma violência se tiver a pretensão e a arrogância de interferir na escola, ainda que com o propósito de melhorá-la. A condução da escola é um assunto de educadores.

A escola pública paulista não é uma vala comum de instituições falidas. Há muitas escolas públicas que ainda mantêm padrões de excelência e, mesmo naquelas ruins, há pelo menos alguns profissionais também excelentes. O que é preciso é assegurar às escolas apoio técnico, financeiro e social para que elas próprias avaliem as suas deficiências e se reorganizem para superá-las. A municipalização do ensino, nessas condições, deve ter um duplo propósito: 1º) mobilizar a sociedade local no sentido de despertar a consciência de suas responsabilidades com relação à escola pública; 2º) pressionar políticos e governos para que a escola pública tenha apoio técnico e financeiro para assumir sua autonomia pela elaboração e execução de seus próprios projetos pedagógicos, capazes de eliminarem deficiências e falhas da instituição.

Notas


Tema 9. A Escola de Aplicação da Feusp - a universidade e a rede de ensino


Nivia Gordo


Para José Mário Pires Azanha, uma escola de aplicação não pode e não deve ser diferente das escolas públicas, pois isto constituiria um desvirtuamento de sua real finalidade.

Não obstante a clareza desta idéia, o risco de estabelecimento de um estatuto privilegiado é permanente numa escola pública de aplicação; a história recente do ensino público paulista está cheia de exemplos de escolas que, pelos privilégios acumulados, desviaram-se do papel que lhes cabia em face da rede pública. Mas, uma escola de aplicação deve, quase paradoxalmente, ser exemplar. Exemplar como indicação da viabilidade de ensino público eficiente sem condições privilegiadas. Principalmente nestes tempos, em que a “má qualidade do ensino público” é a principal razão, ideologicamente manipulada para legitimar o descaso governamental com a escola pública, ganha relevo, até mesmo político, o esforço de demonstração da viabilidade pedagógica de uma boa escola pública
.

Imbuído desta concepção, Azanha aceitou, em 1976, o cargo de representante da Escola de Aplicação junto à Feusp porque viu neste trabalho a possibilidade de concretizar dois importantes objetivos:
* dar à Escola de Aplicação um formato que a tornasse exemplar para as escolas da rede de ensino público;
* por em prática a responsabilidade da Faculdade de Educação no processo de melhoria da escola pública.

Com base nestes objetivos, Azanha, distante do movimento de renovação pedagógica na época, definiu uma diretriz para a EA a que deu o nome de Orientação Geral. Este documento é iniciado com uma crítica severa às idéias dessa renovação e propõe como objetivo da EA “a trivial transmissão de conhecimentos” como condição para a formação de homens capazes de criticar a si mesmos e à sociedade em que vivem. Com o mesmo empenho na crítica às idéias da Escola Nova, Azanha escreveu, entre outros textos, o prefácio “Alain ou a pedagogia da dificuldade” no livro deste autor, deixando clara a inocuidade de certas atividades como “ensino da criatividade”, “ensino recreativo”, entre outras.

Nos documentos propostos para estudo, o leitor tomará conhecimento, também, do projeto de ensino médio elaborado por Azanha e que foi posto em prática na EA a partir de 1985. Este projeto foi considerado exemplar pelo Conselho Estadual de Educação deste Estado que sugeriu sua implantação na rede de ensino médio.

Azanha salientou-se no panorama educacional deste Estado como um grande batalhador em prol da melhoria da escola pública. Neste sentido, deixou clara, entre outras medidas, a necessidade de preservar a autonomia da escola, vinculada à inteira liberdade das equipes escolares para a formulação de sua proposta pedagógica com base nos problemas reais da instituição e num esforço coletivo e contínuo para sua solução. Portanto, esta proposição implica rejeição a intervenções externas de órgãos técnicos e administrativos mediante envio de “pacotes” de orientação metodológica, ou outros documentos prescritivos. Para Azanha, é preciso preservar a liberdade de cada escola para que ela, com base na sua proposta pedagógica, concretize o objetivo de melhoria do ensino. A defesa desse caráter autônomo das instituições escolares inclui, também, a Escola de Aplicação, seja em relação a órgãos superiores externos da rede de ensino, seja no que se refere à própria Faculdade de Educação a que esta escola está vinculada. O que não exclui, evidentemente, o necessário entrosamento entre estas duas instituições, especialmente no que se refere a estágios dos alunos, estudos e pesquisas.

No segundo semestre de 1984, a Escola de Aplicação correu o risco de ser extinta, uma vez que o Reitor da USP questionou em ofício enviado ao Diretor da Feusp a validade de ser mantida uma escola 1º grau na Universidade. Diante deste fato, o Diretor da Faculdade realizou uma série de reuniões com a Congregação para discutir tanto a continuidade do Ensino Fundamental, quanto a implantação do Ensino Médio, pleiteado por pais e professores da EA. O Diretor da Feusp esclareceu que o motivo das reuniões decorria, entre outros fatores, de divergências de ponto de vista quanto ao relacionamento da EA com a Faculdade. Na verdade, essas divergências referiam-se, em grande parte, a desentendimentos havidos entre Nélio Parra e José Mário Pires Azanha, conforme o leitor poderá verificar nas cartas trocadas entre estes dois professores.

Diante deste fato, aliado a outros questionamentos sobre o relacionamento da EA com a Faculdade, Azanha propôs um debate sobre a EA. Para isto, pediu demissão do seu cargo e expôs suas expectativas, adiantando que se elas fossem frustradas, também seria frustrado o próprio debate “transformando-o em mera tertúlia acadêmica”. Essas expectativas são apresentadas nos documentos “A propósito de um debate sobre a Escola de Aplicação” e “A polêmica sobre o sentido de uma escola de aplicação”.

Azanha enfatizou a importância de críticas bem fundamentadas no debate e salientou a responsabilidade do pessoal da Faculdade no sentido de explicitar as alegadas insatisfações, expressas esparsamente e, por vezes, inoportunas por alguns de seus membros. E concluiu:
"Esta é a razão principal que torna este debate um acontecimento insólito. A FE, de fato, sempre foi ambígua na sua responsabilidade para com a Escola de Aplicação. Ambiguidade, no caso, pode eventualmente ser indicação de inconsequência intelectual e de irresponsabilidade acadêmica. Este debate é o momento para que a FE assuma o seu papel acadêmico e desfaça esta suspeita"
.

Nos documentos relativos a atos legais e relatórios administrativos, o leitor tomará conhecimento das diversas disposições relativas à Escola de Aplicação: regimento, relatório de atividades e termos de Cooperação Técnica firmada entre a Secretaria de Estado da Educação e a Universidade de São Paulo que deixam claro o compromisso da Faculdade de Educação com a melhoria da escola pública deste Estado.

O conjunto dos textos apresentados neste arquivo mostra uma série de temas instigantes para a formulação de projetos de pesquisas, estudos, monografias, trabalhos de conclusão de cursos, seminários, entre outras atividades.


(1) AZANHA, J. M. P. Educação: alguns escritos. São Paulo: Ed. Nacional, 1987. p. 169.
(2) Ibid., p. 168.



Tema 10. Linhas de investigação a partir do pensamento de Azanha



Sobre a influência de José Mario Pires Azanha nas pesquisas educacionais

Maria Cecilia Cortez Christiano de Souza



Mas afinal de contas, o que é o método científico? Fiz essa pergunta ao professor José Mário Pires Azanha. Era o ano de 1970 e o curso, Introdução à Pesquisa Educacional. O professor me deixou desconcertada ao responder que o método científico não existia. Naquele tempo, método científico, criatividade e espírito crítico eram senhas que abriam as portas da pedagogia mais avançada. A ciência é essencialmente crítica, observou o professor, e não há formas preestabelecidas para a crítica. No entanto, para exercê-la, é necessário dominar o conhecimento existente. Não existe crítica no vazio. Há imaginação na ciência e não há receitas para a criação científica, continuava. E advertia: a ciência avança também graças a seus erros; as idéias inovadoras ocorrem no espírito de investigadores que giram muito tempo em torno de um problema. Como professor, José Mário considerava a questão da pesquisa educacional como tratava seus alunos: com a mais alta, clara e aguda inteligência.

A propósito da perda de seu cargo, consequência de sua histórica atuação na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, José Mário guardava silêncio. Sobre política dizia que, diante de recursos escassos, deveria ser uma exigência da pesquisa educacional delinear uma pergunta realmente importante, teórica ou politicamente, e de procurar sua resposta com o máximo rigor.

Educação pode ser uma ciência? O caminho seguido por um cientista para fazer suas descobertas devia ser modelo para descrever a aprendizagem do aluno? A didática era a ciência do método? Qual a diferença entre ciência e tecnologia educacional? Qual o papel da pesquisa científica na educação? Existe a experimentação pedagógica?

De 1957 a 1967 José Mário trabalhara no Centro Regional de Pesquisas Educacionais Prof. Queiroz Filho, onde várias dessas questões foram levantadas. A crença no poder da ciência como capaz de resolver os problemas da educação brasileira era arraigada e a autoridade científica configurava-se como único consenso possível em território minado por contradições.

Um dia, logo no início das aulas, no saguão do andar térreo, cercado por um grupo de alunos, o professor José Mário soube que Anísio Teixeira havia morrido. Jovens, ainda não podíamos entender o significado daquela perda, e por que o professor, sempre tão reservado, demonstrou tristeza devastadora. As dependências e os equipamentos do Centro Regional de Pesquisa Educacional haviam sido abandonados pelo Ministério da Educação e jaziam, em meio a ratazanas, ao lado da recém-fundada Faculdade de Educação.

O mergulho de José Mário na pesquisa sobre educação brasileira não deixava de ser, de certo modo, um tributo a Anísio Teixeira, pois tratando de um tema caro a Anísio, colocava em primeiro plano o alcance, a coragem e a beleza do espírito científico. Naqueles tempos de medo, José Mário teimava em fazer do ensino arte iluminista, ato de transparência, fato democrático.

Nos seus ensinamentos, José Mário recuperava as raízes do caráter eminentemente questionador da ciência - a maneira peculiar de convencimento, a seu ver a finalidade dos dados empíricos, a ideia de que o saber científico era hipotético e sempre provisório. Mostrava que nenhuma lei histórica garantia o progresso da ciência, ao contrário, a liberdade de pensamento era uma flor delicada. Afirmava, profeticamente, que a fé cega nos resultados da ciência, tanto quanto o poder absoluto, tem o efeito de corromper o raciocínio e paralisar a razão.

José Mário recomendava o exercício de um ceticismo saudável, pois o abuso de conceitos técnicos havia criado armadilhas difíceis de desarmar na educação. Sempre contrário a linguagens cifradas e a petições de princípio, deslindava pacientemente a lógica interna das pesquisas, analisava conceitos, até trazer à luz o que havia nelas de validade ou de mitificação.

A pesquisa científica não podia ser uma aventura solitária, ponderava. Por essa razão, dizia que era contraproducente a fragmentação da pesquisa resultante da Reforma Universitária de 1969. Segundo ele, as investigações corriam o risco de serem conduzidas pela vontade de um pós-graduando de acompanhar a moda ou pelo desejo de um orientador de conseguir financiamento, ao invés de perseguir um problema educacional realmente necessitado de reflexão e de estudo.

A iniciativa de Anísio Teixeira, com a criação dos Centros Regionais de Pesquisas Educacionais, fora tornar a matéria educacional questão de Estado pela importância estratégica e, ao mesmo tempo, de vinculá-la à Universidade para garantir autonomia e distância necessárias. A educação pública demandava projetos de monta, empreendimentos de longo prazo para que questões pacientemente delineadas por uma geração,cuja tentativa de resolvê-las exigira sacrifícios de outra, não fossem deixadas sem solução. Hoje, as agências e fundações passaram ter o papel antes exercido pelos CRPEs, pela CAPES e pelas universidades públicas e o Estado passou a comprar o que antes produzia por si mesmo.

A pesquisa em educação não devia recuar diante de grandes números, argumentava o Professor, se o problema educacional visado assim o exigisse. Mas nem por isso a tarefa crítica podia ser deixada de lado. Nos seus cursos, penetrava na lógica interna das estatísticas nas ciências humanas, mostrando a que necessidade determinadas fórmulas ou testes estatísticos respondiam. Fazia compreensíveis os passos necessários para a constituição de uma amostra, a maneira de tornar o exame de casos representativos do seu universo, o papel e o uso da noção de probabilidade e de indução na ciência.

Mostrava, principalmente, que pesquisas quantitativas ou qualitativas só são interessantes se baseadas em teorias que direcionem a escolha de procedimentos e a proposição de hipóteses. Uma correlação positiva entre duas variáveis não é suficiente para comprovar causalidade, dizia. E concluía: divulgar resultados sumários era propaganda ideológica pura, nunca ciência.

Não acreditava que o pensamento crítico pudesse ser ensinado; o que mais um curso podia fazer, dizia, era bem instruir. Tinha horror aos modismos e se dizia professor tradicional. Mas o que fazia era transformar a pesquisa em aventura apaixonante e em conversa interminável. Muitos anos após sua morte, ainda me surpreendo, na imaginação, conversando com ele.



Tema 11. Homenagens a José Mário Pires Azanha


  Cristiane Maria Cornelia Gottschalk


Nascido em Santa Cruz do Rio Pardo (SP), José Mário Pires Azanha (1931-2004) assumiu, ao longo de sua vida, diferentes cargos administrativos, políticos e acadêmicos: foi professor primário, professor normalista, diretor de escola e, em 1974, tornou-se professor da recém-fundada Faculdade de Educação da USP, onde lecionou até 2001.

Na década de 1960, foi coordenador do Programa de Assistência Técnica em Educação e Cultura do MEC e membro titular do Conselho Estadual de Educação (1967-1970), retornando ao CEE na década de 1990, quando então assume a presidência deste órgão (1992-1994).

Em 1969-1970, coordenou a realização de ampla reforma na rede pública de ensino paulista, que levou à instituição do ensino fundamental de oito anos, unificando os exames de admissão e facilitando o ingresso nos ginásios da rede pública.

Em 1983, atuou novamente na reorganização da rede pública de ensino do Estado de São Paulo, propondo a autonomia da escola fundada em uma nova e democrática ordenação das relações escolares, já prevendo, talvez, a onda de modismos pedagógicos que iria assolar a realidade educacional brasileira.

Sempre defendendo o ensino público e sua democratização entendida como ampliação radical das oportunidades educativas, publicou 36 artigos em revistas especializadas e cinco livros, sendo o último postumamente. Foi nomeado Coordenador do Conselho da Cátedra UNESCO/USP de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância (1996/1997) e tornou-se membro da Academia Paulista de Educação em 1999. Em 2002 recebe o título de Professor Emérito da Faculdade de Educação da USP.

 

 

 

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